E aí, juiz?
- clarousp
- 19 de mai. de 2020
- 3 min de leitura
Entre polêmicas e possíveis injustiças, as perguntas na arbitragem esportiva estão longe de serem respondidas. Mas a tecnologia até tenta...
Por André Netto e Maria Eduarda Nogueira

Milhares de cliques fotografam quem cruzou primeiro a linha de chegada. Um sensor no traje do esgrimista acusa se houve toque ou não. Por centésimos de segundo, um nadador encosta primeiro nas placas da borda da piscina. Câmeras de vídeo dizem se um lance foi válido ou não. Tudo para responder uma pergunta: quem venceu?

Arte: Guilherme Roque
A tecnologia na arbitragem esportiva existe para tentar diminuir a subjetividade da interpretação humana. Não é raro ver atletas e torcedores reclamando de parcialidade dos árbitros. E, a cada nova competição, inovações são implementadas. "A regra existe devido a algum problema que já aconteceu", explica Danilo Guedes, árbitro de esgrima.
Mesmo assim, as perguntas continuam. Ainda que o nadador toque o sensor na borda da piscina primeiro que seu adversário, a vitória pode não ser uma certeza. Thiago Pereira, nos Pan-Americanos de 2015, que o diga. Apesar de ter chegado primeiro que seu compatriota Brandonn Almeida, foi desclassificado por causa da virada: para o árbitro, ele tocou apenas com uma mão, o que é proibido.

Na postagem em seu Instagram, o atleta confrontou a arbitragem, postando uma foto que prova que ele, na verdade, tocou com as duas mãos. (Imagem: Reprodução/Instagram)
Nas Olimpíadas de Tóquio de 2021, as dúvidas serão mais facilmente respondidas. Isso porque a natação passa a implementar o árbitro de vídeo – o polêmico VAR. "Todas as desclassificações feitas na borda da piscina serão confirmadas ou rejeitadas pelo VAR. É uma modificação significativa", explica o comentarista do Globo Esporte, Alex Pussieldi.
Vai ganhar, vai perder… Perdeu!….Ganhou!
A alta performance dos atletas tornou a narração de Galvão Bueno um meme na Olimpíadas de Pequim, em 2008. Os disputados 100m borboleta entre Michael Phelps e Milorad Čavić geraram dúvidas até o último centésimo de segundo. E a pergunta "quem venceu?" só foi respondida por conta da tecnologia.
Foi pênalti?
Finalmente damos o apito inicial para falar da tecnologia do futebol: o VAR. Ainda que ele seja a bola da vez, o Video Assistance Referee não foi o primeiro sistema destinado a auxiliar a arbitragem. Em 2012, a FIFA já testava no Mundial de Clubes o GLT (Goal Line Technology), equipamento de câmeras hawk-eye que permitem ter exatidão se a bola entrou ou não no gol. Se ela realmente cruzar a linha, o juiz recebe um aviso em seu relógio. Foi o que aconteceu com o árbitro brasileiro Sandro Meira Ricci em 2014, quando o sistema validou pela primeira vez um gol em Copa do Mundo.
As coisas evoluíram até chegarmos ao VAR, que funciona assim:

Arte: Guilherme Roque
Mas se a tecnologia tem uma grande eficácia substituindo nossos olhos, o mesmo não pode ser dito para o VAR, porque uma parte da equação segue intacta: o ser humano. E o ser humano erra. O árbitro de vídeo deve tirar as dúvidas do juiz, mas isso não significa que ele não irá se enganar ou mesmo ter dúvidas próprias. No Campeonato Brasileiro de 2019, o VAR assinalou um pênalti polêmico para o Palmeiras que acabou dando a vitória para a equipe paulista.
O Botafogo entrou na justiça esportiva para tentar anular o jogo, mas acabou derrotado dentro e fora de campo. Lances como esse mostram que a pergunta “Foi pênalti?” provavelmente nunca terá uma resposta certa, pois dependem da interpretação de cada um.
E a discussão sobre o VAR está caminhando em diversos rumos. Os impedimentos milimétricos que podem ser assinalados com o auxílio das câmeras reacenderam discussões sobre uma das regras mais básicas do jogo. A IFAB (International Football Association Board), órgão responsável pelas regras do futebol, passou a ouvir propostas para mudanças nas regras do impedimento, principalmente por conta de duas questões: Impedimentos milimétricos devem ser marcados? Esses lances são erros claros que devem ser revistos pelo árbitro de vídeo? Ainda não temos respostas para essas perguntas, mas elas podem mudar significativamente o jogo como o conhecemos hoje.
A Inglaterra é um dos países com maior rejeição ao VAR. A anulação
do gol de Heung Min-Son por conta de um impedimento milimétrico
gerou muita polêmica e debate sobre a ferramenta.
(Tradução: Isso é o que futebol se tornou. É abismal.)
Mas o principal desafio, especialmente no Brasil, é a demora para tomar as decisões, como explica a ex-árbitra e comentarista da ESPN Renata Ruel: “Você tem que saber mexer com a ferramenta em tempo recorde, esse é o grande problema hoje. Tomar uma decisão muito rápida no VAR para não perder tempo de jogo”.
É inegável que a tecnologia chegou para ajudar a responder as dúvidas da arbitragem. Em situações de preto no branco, ela é extremamente decisiva. Porém, a regra deixa margem para interpretações, e aí o fator humano dificilmente sairá de ação. A tecnologia até tentou, mas, pelo menos neste primeiro tempo, as discussões de boteco são as vencedoras.
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