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Do studio ao feudo: um diálogo através dos séculos

  • clarousp
  • 19 de mai. de 2020
  • 3 min de leitura

Por Ana Gabriela Zangari Dompieri


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Arte: Ligia Andrade


Estive pensando… Porque eu sou eu, Ricardo, e não ele, Lucas? Meio estranho né, mas tipo assim, como eu exerço esse “ser eu e não ele”.


Aristóteles cochicha para si em sua cadeira “pois bem, garoto, a começar pelo fato de que vocês são feitos de matérias diferentes…”


Interessante. Chegou a alguma conclusão?

Bom, eu acho que, reparando melhor, uma coisa importante é a independência financeira. O Lucas, por mais que seja meu irmão, não tem isso ainda. É algo que nos diferencia… E também permite que eu me diferencie do meu pai; se não fosse isso era provável eu ainda estar morando lá e fazendo Direito, tal qual ele.

E onde você mora hoje?

Eu moro num apartamentinho bem pequeno, se chama studio. É um prédio. Várias pessoas moram em cada andar, mas o espaço que cada um tem é nada maior que o suficiente. Hoje quase tudo está ficando on-demand.


Jeff Bezos sorri com o canto da boca. Os inventores do Taylorismo se entreolham, satisfeitos.


Hum… Sobre o “não mais que o necessário”, temos algo em comum. Aqui é assim que funciona, nossa comunidade é autossuficiente em quase tudo. E eu moro com várias pessoas também. Ainda mais se você considerar o feudo inteiro. Mas, mesmo assim, espaço não falta.

Nossa, mas você não se sente preso? Minha casa é pequena, mas eu me sinto livre, porque posso fazer o que eu quero quando eu quero. Ir aonde quiser. E liberdade eu também diria que é essencial para que eu possa exercer aquele “ser eu” de que falava. Poder fazer escolhas…

Locke e Sartre assistem orgulhosos.

Temos escolhas. Escolho entre trabalhar, fugir e morrer. Os últimos dois são quase o mesmo, na verdade. Lá fora as coisas são piores… Apesar dos pesares, gostamos de estar entre os muros do nosso senhor.


Marc Bloch fuzila Marx com o olhar e comemora: “eu falei! não é só exploração; eles são parte ativa na relação de servidão, eles trocam mão de obra pelo serviço militar dos nobres”. “ok, Marc, se acha que isso te dá toda a razão…”


Que difícil! Bom, mas é isso então, você não sente a necessidade de ser diferente?

Olha, aqui cada um sabe bem o seu lugar, somos muito diferentes na largada, não preciso me esforçar pra isso. Sou Asher, filho de Francis e Marilen, servo do arquiduque Hemmingway. Meu sangue me define.

Mas você não quer escalar nada mais para si? Pôr algo de seu no mundo?


Um par de coaches observa debruçado na cadeira, intrigado.


Bem, eu acredito que estar escalando meu lugar no céu. E isso é muito; até para se dizer.

E seus interesses pessoais?

É do meu interesse que tenhamos o que comer. Do meu e de todos, que os clérigos estejam rezando por nós. E também que os nobres guerreiem, se preciso for, para defender as terras onde moramos. Meu interesse é o interesse de todos, vê? O seu é só seu?

Bom, sim… Vocês são bem unidos então. Aqui, pela Constituição, todos somos iguais, mas acho que o que mais nos aproxima é a vontade de sermos diferentes uns dos outros. Você tem que tentar fazer quem você é.

Nossa… Que difícil.


Colaborou: Oswaldo Akamine Júnior, doutor em Direito pela USP na área de Filosofia e Teoria Geral do Direito e professor da Facamp.


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O suplemento Claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo Impresso III.

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