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Despido de rótulos

Por André Derviche e Bruno Militão



“Retire suas roupas.” Essa pode ser uma instrução para que o leitor repense sua relação com os corpos. Retirar as roupas. Também foi o primeiro estímulo que Filipe Seabra (27) teve ao visitar, pela primeira vez, uma praia naturista onde o nudismo é obrigatório.


A mensagem imperativa, que Filipe viu antes de abaixar seu short, está em uma placa na praia de Massarandupió, ao norte de Salvador, na Bahia. O local é uma das oito praias naturistas de nudismo oficiais que existem no Brasil, apoiadas por legislações estaduais, municipais e por 15 associações.


“A sensação de liberdade foi algo que me deixou bem, não por mostrar para os outros, mas só por estar despido”, ele conta. “Eu fiquei muito feliz de sentar em uma das barracas da praia e ficar ali, peladão; depois ir no mar, sem nenhuma sunga enchendo de areia, só o mar batendo em você…”


O que Filipe sentiu é o que o naturismo busca proporcionar. Essa filosofia, que pode virar prática e até estilo de vida, surgiu no século XIX na onda do romantismo alemão que idealizava o ambiente natural e sua função terapêutica. O contato direto do Sol com a pele, por exemplo, ajudava no tratamento de doenças via helioterapia. Foi assim que, com o passar do tempo, a prática passou a abraçar a nudez, a qual facilitaria a conexão do ser humano com a sua essência mais pura e próxima da natureza.


Despir-se simboliza o desligamento de rótulos e padrões sociais que as roupas impõem. A obrigatoriedade da ausência de roupas em locais naturistas garante que a pele do nudista em primeira viagem respire junto a outras.


Dentro desse estilo de vida, o corpo é uma ferramenta de integração com a sociedade. A comunidade que vive na região de Massarandupió conta com o apoio da Federação Brasileira de Naturismo (FBrN), que ajudou na montagem de uma ecovila e de um ecoparque. “O naturismo traz essa ação social para todos, não só para mim”, afirma Paula Silveira, presidente da FBrN de forma voluntária.


Como alguém que vivencia o nudismo “sempre que lhe é permitido”, Paula explica os conceitos por trás de sua filosofia de vida para quem se mostra curioso no dia a dia. “As pessoas entendem. Eu nunca sofri nenhum problema com relação ao nudismo.” A FBrN busca difundir o naturismo, o que esbarra no conservadorismo de parte da sociedade que associa o mostrar a pele ao erótico e malicioso.


Segundo o psicanalista Arthur Rodrigues, a nudez ainda é chocante porque é sexualizada. Ao pensar em paralelos com erotismo ou pornografia, a diferença está no sentido que se dá às situações.


Por outro lado, espalhar a palavra dessa filosofia nem sempre foi consenso entre praticantes. O antropólogo Luiz Fernando Rojo Mattos acompanhou o movimento de 2001 a 2005 para a realização de seu doutorado e relata que alguns pensavam que o naturismo seria limitado àqueles 'mais evoluídos e desenvolvidos’.


Foi séculos antes da viagem do Filipe a Massarandupió que o pensador francês Rousseau idealizou a figura do “bom selvagem”, puro, inocente e alheio aos vícios da sociedade. Não à toa que ele era imaginado nu pelo filósofo. Foi assim que a pele à mostra atravessou a História e chegou a conceituações mais filosóficas como o naturismo. Em tempos de desconstrução de padrões estéticos e reflexões ambientais, ele se mostra recurso valioso para grupos da sociedade.


 

Colaboraram:

Arthur Toledo Rodrigues, psicólogo e psicanalista Filipe Seabra, publicitário Luiz Fernando Rojo Mattos, antropólogo e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) Paula Silveira, perita contábil e presidente da Federação Brasileira de Naturismo (FBrN)


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