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Ai, como coça...

Por Vinícius Lucena


Arte por Amanda Mazzei e Luana Benedito

“Vinte anos com crises constantes e internações, à base de muitos remédios e vários tratamentos”. É assim que Suzana, aos 26 anos, descreve sua relação com a dermatite atópica grave. Ela é uma das pessoas que habitam peles sensíveis, duramente afetadas pela mente.


Através de arrepios ou suor nas mãos, sentimos a relação direta entre a pele e o psicológico. Para algumas pessoas, esta relação é conflituosa, recheada de coceiras e inflamações. Por meio de neurotransmissores, o estresse pode desencadear diferentes reações no órgão e agravar diversas doenças.


O diagnóstico é feito por um dermatologista, geralmente, após a inspeção da pele e escuta dos sintomas. Em alguns casos, porém, é necessária uma biópsia seguida de exames para o firmar.


É o caso de Algemira, que convive com a psoríase na palma das mãos desde os 30 anos, embora só tenha recebido o diagnóstico aos 44, após exames. Segundo a corretora de textos, duas tragédias promoveram a doença: a morte do sobrinho e a notícia de que sua mãe estava com câncer.


Já Tailini, aos 20 anos, descobriu que os tons de vermelho em seu rosto se tratavam da rosácea crônica. É comum a doença se manifestar apenas em momentos de ansiedade, sumindo logo depois. Entretanto, no caso da professora de educação física, as manchas avermelhadas são constantes.


Cremes, hidratantes, pomadas, lasers e remédios não são suficientes para conter os rompantes emocionais que afloram na pele. E vale tudo para evitar comentários indelicados e preconceituosos.


Algemira parou de usar anéis e criou o hábito de esconder suas mãos constantemente. Para Tailini, a maquiagem no rosto se tornou obrigatória, ao ponto de recusar ir ao parque aquático com amigos, para que eles não vissem suas manchas.


Profissionalmente, ambas relatam problemas, seja pelo suor, que agrava as manchas da educadora física, ou pelo constante uso das mãos, que piora as feridas da professora de português, ainda que use luvas de vinil para trabalhar.


No caso de Suzana, coisas simples, como tomar banho ou lavar a louça, são motivos de dor e desconforto, pois o sabão agrava a dermatite. Ela desabafa que, por ter o corpo todo manchado, o preconceito afetou sua socialização.


Segundo pesquisa da Sociedade Brasileira de Dermatologia em parceria com o Datafolha, feita neste ano, três em cada dez brasileiros acreditam que a dermatite atópica é um problema de saúde contagioso. Tal percepção não se limita à dermatite, pois o preconceito transcende as doenças.


O primeiro passo é aceitar que o quadro emocional apresenta relação com os problemas de pele. Segundo Abdo Salomão Júnior, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia, muitos pacientes hesitam em iniciar um tratamento multidisciplinar com psicoterapeutas e dermatologistas, por não acreditarem no fator psicológico como influência para tais problemas, o que agrava a situação.


Além disso, a autoaceitação é fundamental e, em grande parte dos casos, conquistada depois de muita reflexão e terapia. Conviver com olhares tortos e perguntas indelicadas é difícil. Entre altos e baixos, cada mancha e cicatriz se torna uma história de superação.


Tailini, Suzana e Algemira não se deixam definir pela condição da pele. Para elas, fazer as pazes com o próprio corpo é uma escolha diária, e não sobrou espaço para aqueles que já ousaram zombar de suas condições. Apesar da dor, suas peles são símbolo de resiliência e do triunfo de aceitar a si mesmo — contra qualquer tipo de preconceito.


 

Colaboraram:

Abdo Salomão Jr., diretor da Clínica Dermatológica Abdo Salomão Junior e sócio efetivo da Sociedade Brasileira de Dermatologia

Algemira Kollar

Patrícia Mafra, dermatologista pela Sociedade Brasileira de Dermatologia e dona da Clínica Patrícia Mafra

Suzana de Almeida Costa Mesquita (@minhavidacomdermatite)

Tailini Lúcia de Lima (@diaadiacomrosacea)


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