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Mais pra lá, por favor

por Kaynã de Oliveira e Natasha Teixeira


Arte por Luana Benedito e Maria Luísa Bassan

Dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar, alega a metafísica. Às vezes, dois seres não deveriam nem ocupar o mesmo ambiente. A paz vai embora e a tensão toma conta ao encontrar com aquela pessoa.


Quando a antipatia se instala, nem o distanciamento físico garantido pelas telas de computador resolve. Giovana que o diga. Enquanto todos a esperavam na reunião online do trabalho, ela encarava a tela de início do Google Meets, seus ombros enrijeciam e o peito enchia de angústia. O assunto nem era tão importante, a fonte do desconforto era outra: a colega de trabalho. Nem longe a paz chega. “Quando eu tirei férias, tive pesadelos voltando a conversar com ela”, desabafou.


“Pelo menos você não convive com a presença da pessoa!”, respondeu Álvaro, indignado. Tem parente que longe é melhor. Até os almoços de família, que eram para ser leves e afetuosos, vão por água abaixo quando o tal cunhado toca a campainha. Vixe! A alegria se esvazia como balão de festa no dia seguinte.


A psicóloga, Leila, aconselhou: ninguém é obrigado a gostar de ninguém, e o melhor é manter distância. Mas, quando ela faz falta, nos resta apenas manter o respeito para que a relação seja harmoniosa. Ao ouvir isso, rompe um suspiro: “mas quando um não quer, dois não fazem”.


A dona desse suspiro é Jéssica. Ela convive com o padrasto na mesma casa, dividindo a mesa do café da manhã e compartilhando o churrasco de domingo. Isso num ambiente em que a enteada tem seus hábitos cerceados pelo dito cujo. Ama dançar? Não pode. Receber amigos? Nem pensar! Shorts curto? Em casa jamais!


É preciso dar nome aos bois: o que Jéssica sofre é machismo. Leila esclareceu que, se esse desafeto se tornar grave e abusivo, não pode titubear, deve-se contatar as vias legais e exigir respeito.


Mas o inimigo nem sempre mora ao lado. Às vezes, trabalha no mesmo local que você. Talvez inimigo seja uma palavra muito forte, mas como definir quem faz o inferno na vida de outrem?! Para Milena, essa pessoa tem nome, endereço e CPF. De cochicho em cochicho a conversa aumentada chega em quem não devia. Quem foi? A própria. O clima até pesa quando chega a fulana.


Acontece que nem sempre vamos nos dar bem com todo mundo. Conflitos ocorrem com maior frequência do que a gente gostaria. E quem não tem a opção de se afastar, faz o quê? Assim como Giovana e Milena precisam do emprego, Álvaro e Jéssica precisam de um teto para morar.


Ana Cristina, que não é só moça do RH, mas uma especialista em qualidade de vida, explicou que, em alguns casos, deve haver um chefe (de família ou de trabalho) para cuidar do clima do ambiente. Quando os desafetos convivem, os envolvidos ficam desmotivados, a tristeza se instala e em alguns casos pode ocasionar assédio. É preciso haver segurança psicológica, que é conquistada com treinamentos, preparação de líderes e atenção especial para os relacionamentos.


Quando não há nada disso, cada um lida do seu jeito. Alguns ignoram, outros tentam o diálogo e há quem exploda. Mas a verdade unânime é que de algumas pessoas a gente sente saudade, já de outras é a distância (física, social e emocional) que realmente faz falta. E como faz!


 

Colaboraram:
Álvaro Filho - designer de interiores
Ana Cristina Limongi-França, docente aposentada do Departamento de Administração da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, especialista em qualidade de vida e gestão de pessoas Giovana (nome alterado a pedido da fonte) - jornalista
Jéssica Oliveira - atendente de telemarketing Leila Salomão Tardivo, docente do Instituto de Psicologia da USP e pesquisadora do Observatory of Health and Citizenship
Milena Martiliano - estudante de direito
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